Sobre guerras e tréguas

Trégua era durante aquela fatia miúda no relógio quando o travesseiro descansava sua guerra. Batalha. Navalha. Migalha. Ou coisa que o valha. Lutava, cortava e restava. Aquele rosto de bigode era só resto. Resto de felicidade, de paciência e de esperança. Deitava o corpo na cama meio que torcendo pra não precisar mais levantar. Entrava ali em seu coma. Organizava suas tristezas na prateleira. Separava por tamanho. Aí depois ia tentar sonhar. Ia imaginar que ela era quase perfeita, seus defeitos eram só pra ele ter certeza de que ela existia. Eles se abraçavam, ela ria o mínimo que precisava pra ele saber que ela estava bem. E quando ela não ria, tinha alguma coisa maior que os mantinha juntos. Uma algema de atrito guardava um no outro. Qualquer distância parecia que era fuga, parecia que era sempre. Ela mostrava os ruídos dele, mas também se machucava. Ele não fazia bem pra ela. Nos dois, a confusão. O ponderar querendo resistir. Vendavam os olhos e deixavam se sentir. Certos, contudo, do inevitável avesso. Viviam, pois, nas tréguas. Dormindo, se esqueciam. Pra quando acordarem, terem aquele gostinho bom de se lembrar. Lembrar que por mais errado que tudo fosse, as tréguas valiam a pena.