Um silêncio de graça.

Eles se aguentam infinitos, só se olhando. Mais que dizer, querem se decifrar. Descobrir alguma certeza onde sempre parece que não há. Tem vez que é silêncio, tem vez que é revolta, tem vez que é tristeza, tem vez que é descaso, tem vez que é sorriso, tem vez que é risada, tem vez que não é nada mesmo, tem vez que é tanta coisa junta! Um meio que desafia o outro. Perdem o sentido, perdem as palavras. Se encaram na ausência do que mais insinuar. A procura inútil por mais “quases”. Se esperam no fim das palavras que agora se repetem e cansam e cansam e voltam e cansam e dormem.

Continua o desafio. Geralmente ela sorri primeiro. Ficam se enfrentando, se esperando, se abraçando de longe, se conversando calados, se cutucando, se procurando espaços, se segurando de medo de o outro pensar noutra coisa. Engraçado, não fosse essa agonia da ignorância. Tem hora que eles se desejam que estivesse escrito na testa. Sentimentos e ressentimentos. E que ficasse tudo claro. Mas é que eles não sabem se escrever direito. Tudo metáfora, tudo implícito, tudo rabiscos e laços amarrados e traços largados e pedaços rasgados e meios abraços meio que só abraços ou meio que são pedaços faltando de um lado e de outro talvez. Não se agarram, não se amargam, não se são num só. Se preferem ali nos desafios, nos destratos, nos atritos. Nos atrai a distância. Nascida pra ser distância, nascidos pra serem distantes, destoantes, divergentes, diferentes, de repente beijo. Foi-se na demora das palavras lacradas. Choveram as letras certas, embaçou tudo. Sorriram juntos, meio que perderam juntos. Leram no outro sorriso o mesmo livro que sofriam pra escrever.

São assim, momentos. Segundos. Reviravoltas. Não pausados, mas um atrás do outro, simultâneos e sem ligações. Tudo ou nada, sem meio termo, sem copos meio cheios e meio vazios ou meios sentimentos. Permeiam em explosões e doçuras, e nada nunca está bom, sempre há falta. Ou sobra. Tudo ali tem importância e ela, que sempre sorri, fica séria. Se fala, se arrepende. Se cala. Se pergunta se há outro jeito. Você que sente sabe, não adianta, há sempre outros argumentos, há sempre mil hipóteses, nunca certezas. Nunca exclamações. Se exclama mesmo só a vontade, de resto a explosão vem sempre acompanhada da interrogação. E assim se interrogam todos os dias. Aquele beijo? Ele aconteceu ou foi só um devaneio conjunto implícito entre esses olhares intermináveis e indecifráveis deles?

Aconteceu. Não aconteceu. Acontece é que ele não cabe na história. Não cabe em tanto silêncio seu louco silêncio sufoco agora saudade que começou. É silêncio de longe. E de longe, até as palavras são silenciosas. Tudo é quase, sem força de nada. Só se diz pelas beiradas, mastigando o silêncio quando ele incomoda. Mas tudo bem, ela sorriu primeiro.


- com Isadora Fachardo